sexta-feira, 15 de outubro de 2010

IGREJA E ELEIÇÃO


Como católico estou "muito angustiado..." Acompanho eleições presidenciais desde 1989, não votava, mas recordo-me muito bem daquela disputa. De lá pra cá foram outras tantas eleições sempre muita acirradas, mas não me lembro de nada parecido com o que ocorre neste pleito, quanto a participação da nossa Igreja (Católica Apostólica Romana).

Mais do que nunca, acho que a participação da Igreja deve ser de orientar, promover a reflexão, defender os valores da vida e a propagação de uma política libertadora, geradora de dignidade às pessoas. Ultrapassar este liame é provocar descontentamentos, litígios e divisões... A Igreja deve tomar partido, mas nunca ser um partido político!

Não sei quem ganhará esta eleição... Seja feita a vontade do povo ! Que esta vontade não seja viciada é o que rezo a Deus. Uma coisa, no entanto, tenho certeza: A nossa Igreja; os seus cabeças (Bispos) foram derrotados. É clara a divisão estabelecida... Bispos, Padres,  Pastorais e Movimentos se confrontam e não se entendem nestas eleições...

Reproduzimos nas publicações abaixo, cenas desta confusão que foi transformar uma eleição numa cruzada religiosa que deixa qualquer fiel, no mínimo, desorientado...


Luiz Teixeira


“A gente não quer um presidente mentiroso”, diz padre Murilo

Pároco de Parnamirim acusa Serra de caluniar Dilma Rousseff e contesta grupos religiosos que utilizam espaço litúrgico para fazer campanha eleitoral.

Pároco da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Parnamirim, Antônio Murilo de Paiva declarou que a campanha do candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, caluniou Dilma Rousseff (PT), candidata à sucessão do presidente Lula (PT), ao afirmar que a petista é favorável ao aborto e ao casamento gay.

“Essas declarações da campanha de Serra são fundamentadas na mentira. A gente não quer um presidente mentiroso. Foi a mentira e a calúnia que levaram ao segundo turno”, disse Murilo, que foi um dos padres a assinar o manifesto em favor “da vida e da vida em abundância”, divulgado nesta sexta-feira (15).

Aborto
O padre Murilo explica que é contrário ao aborto, mas defende que as mulheres que abortam sejam assistidas. “Vamos deixar morrer? Isso tem que ser regulamentado no Brasil e é isso que Dilma propõe. Por conta disso, Serra diz que ela é a favor do aborto”, disse.

O religioso recordou que foi Serra que, enquanto ministro da Saúde no governo de Fernando Henrique Cardoso, assinou a legislação que instituiu no Sistema Único de Saúde (SUS) as normas técnicas para o aborto em caso de violência sexual. “Agora Serra acusa Dilma. É usar o aborto para tirar vantagem eleitoral”, disparou.

Casamento gay
Padre Murilo disse que Dilma não declarou que era a favor do casamento gay. “O que ela disse é que devemos respeitar a orientação sexual”, explicou, emendando que a campanha de Serra teve uma interpretação errônea.

Campanha nas Igrejas
O religioso condenou o uso do espaço litúrgico, por parte de alguns grupos religiosos, para fazer campanha política. “Faço isso fora da Igreja”, frisou, acrescentando que tanto na Igreja Católica quanto em outras Igrejas houve propaganda eleitoral irregular.

“Na Igreja você pode trabalhar a consciência política, comparar modelos de governar, mas não pode pedir votos. E houve esse pedido de voto explícito, inclusive com distribuição de panfleto. Isso é crime eleitoral”, advertiu o padre.

Fonte: Nominuto.com

''A credibilidade da CNBB está sendo colocada em xeque''

“A credibilidade da CNBB está sendo colocada em xeque”, alerta Dom Luiz Demétrio Valentini, bispo da Diocese de Jales-SP, ao comentar o episódio de que a instituição teria aconselhado os católicos a não votarem na candidata do PT à presidência, Dilma Rousseff. Em entrevista concedida, por telefone, à IHU On-Line, Dom Valentini esclarece que em torno do assunto “existe uma falácia que precisar ser desmontada”.

Para ele, o nome da CNNB foi invocado com posições “que não são dela (...) foi feito um estratagema para vincular opiniões pessoais de alguns bispos à imagem da CNBB”. Ele explica: “O equívoco maior se deu no Regional Sul I da CNBB: a presidência recomendou que todos lessem e, levassem em consideração, uma manifestação de duas comissões diocesanas, onde se manifestava, claramente, posições preconceituosas contra Dilma e o PT. A solicitação de que esse documento deveria ser levado em conta, comprometeu o posicionamento do Regional. Com isso, se criou a ambiguidade e o equivoco de que todo o Regional estava de acordo com esse posicionamento, o que não é verdade”.

A segunda falácia, aponta, é ainda mais difícil de ser compreendida. “O fato de lançar a condição de abortistas a todos aqueles que propõem políticas sociais que levem em conta a situação do aborto para melhorar a legislação e as providências para favorecer a vida e evitar situações de aborto”.
Na avaliação dele, instituição que “sempre marcou presença na realidade brasileira”, a CNBB deve se pronunciar diante deste fato, “esclarecendo que ela não tem posição partidária, não tem restrições a nenhum dos dois candidatos”.

Licenciado em Letras pela Faculdade de Palmas, no Paraná, Dom Valentini  fez o curso de Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma, e foi ordenado presbítero em 1965. Foi professor no Centro Universitário de Erexim e na Universidade de Passo Fundo.  Durante muitos anos foi pároco na diocese de Erexim, RS quando foi nomeado bispo de Jales, SP, em 1982. Durantes muitos anos foi responsável pelo Setor Pastoral Social da CNBB, período no qual se realizaram as Semanas Sociais Brasileiras. Atualmente é também presidente da Cáritas Brasileira.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – No primeiro turno, alguns bispos aconselharam a sociedade a não votar na candidata do PT, Dilma Rousseff. Qual a postura da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB nessa questão?
 
Luiz Demétrio Valentini – Esse é um assunto sério e merece muita atenção. Penso que a credibilidade da CNBB está sendo colocada em xeque. A CNBB, tradicionalmente, sempre marcou presença na realidade brasileira como uma entidade responsável que colaborou para a implantação da democracia no Brasil, ciente, claramente, da sua responsabilidade própria. Agora, corre o risco de ser mal interpretada por equívocos acontecidos por manobras em andamento. Existe uma espécie de falácia que precisa ser desmontada e esclarecida. Essa falácia consiste, em primeiro lugar, em invocar o nome da CNBB sobre posições que não são dela. Foram impressos milhares de folhetos com a mensagem: “CNBB proíbe católicos de votarem em Dilma, do PT”. Isso não é verdade. Foi feito um estratagema para vincular opiniões pessoais de alguns bispos à imagem da CNBB. O equívoco maior se deu no Regional Sul I da CNBB: a presidência recomendou que todos lessem e levassem em consideração uma manifestação de duas comissões diocesanas, onde se manifestava, claramente, posições preconceituosas contra Dilma e o PT. A solicitação de que esse documento deveria ser levado em conta comprometeu o posicionamento do Regional. Com isso, se criou a ambiguidade e o equivoco de que todo o Regional estava de acordo com esse posicionamento, o que não é verdade. Isso influenciou o resultado das eleições.

Manifesto de Cristãos e cristãs evangélicos(as) e católicas(os)

"Se nos calarmos, até as pedras gritarão!"

Manifesto de Cristãos e cristãs evangélicos/as e católicos/as em favor da vida e da Vida em Abundância!

Somos homens e mulheres, ministros, ministras, agentes de pastoral, teólogos/as, padres, pastores e pastoras, intelectuais e militantes sociais, membros de diferentes Igrejas cristãs, movidos/as pela fidelidade à verdade, vimos a público declarar:

1. Nestes dias, circulam pela internet, pela imprensa e dentro de algumas de nossas igrejas, manifestações de líderes cristãos que, em nome da fé, pedem ao povo que não vote em Dilma Rousseff sob o pretexto de que ela seria favorável ao aborto, ao casamento gay e a outras medidas tidas como "contrárias à moral".
A própria candidata negou a veracidade destas afirmações e, ao contrário, se reuniu com lideranças das Igrejas em um diálogo positivo e aberto. Apesar disso, estes boatos e mentiras continuam sendo espalhados. Diante destas posturas autoritárias e mentirosas, disfarçadas sob o uso da boa moral e da fé, nos sentimos obrigados a atualizar a palavra de Jesus, afirmando, agora, diante de todo o Brasil: "se nos calarmos, até as pedras gritarão!" (Lc 19, 40).

2. Não aceitamos que se use da fé para condenar alguma candidatura. Por isso, fazemos esta declaração como cristãos, ligando nossa fé à vida concreta, a partir de uma análise social e política da realidade e não apenas por motivos religiosos ou doutrinais. Em nome do nosso compromisso com o povo brasileiro, declaramos publicamente o nosso voto em Dilma Rousseff e as razões que nos levam a tomar esta atitude:

3. Consideramos que, para o projeto de um Brasil justo e igualitário, a eleição de Dilma para presidente da República representará um passo maior do que a eventualidade de uma vitória do Serra, que, segundo nossa análise, nos levaria a recuar em várias conquistas populares e efetivos ganhos sócio-culturais e econômicos que se destacam na melhoria de vida da população brasileira.

4. Consideramos que o direito à Vida seja a mais profunda e bela das manifestações das pessoas que acreditam em Deus, pois somos à sua Imagem e Semelhança. Portanto, defender a vida é oferecer condições de saúde, educação, moradia, terra, trabalho, lazer, cultura e dignidade para todas as pessoas, particularmente as que mais precisam. Por isso, um governo justo oferece sua opção preferencial às pessoas empobrecidas, injustiçadas, perseguidas e caluniadas, conforme a proclamação de Jesus na montanha (Cf. Mt 5, 1- 12).

Não assine carta nenhuma, Dilma!

Que petulância, que falta de noção, que desrespeito! Quem pensam que são estas “lideranças de igrejas evangélicas” para exigir da candidata Dilma Roussef que assine uma “carta à nação” em troca do apóio eleitoral dos seus fiéis?

Os autoproclamados enviados de Deus querem que ela se comprometa, caso seja eleita, a vetar a união homossexual e a adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo, na mesma linha da onda que já vêm fazendo em torno da descriminização do aborto.

Trata-se, antes de tudo, de um desrespeito ao Congresso Nacional, que é quem deve discutir e deliberar sobre estes temas. Custo a acreditar no que leio publicado no jornal, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Já pensaram se cada seita ou tribo, torcida de futebol ou escola de samba, sindicato patronal ou de empregados, clube da terceira idade ou associação de creches, qualquer instituição ou entidade se julgar agora no direito de exigir dos candidatos uma “carta à nação” em defesa dos seus interesses?

Os setores mais conservadores da igreja católica ainda não chegaram a tanto, mas seus bispos e padres estão agindo exatamente como os pastores dos dízimos, transformando seus altares em palanques e distribuindo panfletos inspirados na TFP (Tradição, Família e Propriedade), o decadente braço religoso da extrema-direta brasileira, que já colocou a cabecinha de fora.

Claro que a oposição está gostando da brincadeira. Seus líderes mais afoitos estão achando que descobriram de repente um tesouro de votos, beijando terços por onde passam, tomando bençãos e mastigando hóstias, como se estivéssemos numa campanha para a sucessão de Bento 16 e não para eleger o presidente do Brasil.

Daqui a pouco, só está faltando mesmo convocar mais uma “Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade”, como os mesmos entes religiosos e os mesmos orgãos de imprensa fizeram em 1964, e levaram o Brasil para o fundo do buraco de vinte anos de ditadura militar.  
Já deve ter gente se preparando para recolher o “ouro para o bem do Brasil”, que fez a fortuna de alguns malacos naquela época. Levaram até a aliança de ouro da minha avó, coitada, que tinha medo da “invasão comunista”.

Como sabem os leitores do Balaio, ao contrário de muitos dos meus colegas blogueiros e colunistas, não sou de dar conselhos a candidatos que devem entender de política e de eleições um pouco mais do que eu.  Como qualquer cidadão brasileiro, no entanto, preocupado com o que anda acontecendo neste inacreditável segundo turno, apenas peço encarecidamente a Dilma Rousseff que não assine carta nenhuma.

Não vale a pena querer ganhar eleição a qualquer preço. A conta a ser paga, depois, é alta demais.

Ricardo Kotscho - Blog Balaio do Kotscho