Luiz Teixeira
MIGUEL WEBER, esposo da Prefeira se defende.
O homem chega à feira e lá encontra seu companheiro, arrumando os peixes num imenso tabuleiro de madeira. Cumprimentam-se. O feirante está contente com o sucesso do seu modesto comércio. Entrou no negócio há poucos meses e já pôde até comprar um quadro-negro para badalar seu produto.
Atrás do balcão, no quadro-negro, está a mensagem, escrita a giz, em letras caprichosas: HOJE, VENDO PEIXE FRESCO.
Pergunta então ao amigo e compadre:
- “Você acrescentaria mais alguma coisa?”
O compadre releu o anúncio. Discreto, elogiou a caligrafia. Como o outo insistisse, resolveu questionar. Perguntou ao feirante:
- Você já notou que todo o dia é sempre hoje? E acrescentou: acho dispensável. Esta palavra está sobando…
O feirante aceitou a ponderação: apagou o advérbio. O anúncio ficou mais enxuto: VENDO PEIXE FRESCO.
- Se o amigo me pemitir – tornou o visitante – gostaria de saber se aqui nessa feira existe alguém dando peixe de graça? Que eu saiba, estamos numa feira – e feira é sinônimo de venda. Acho desnecessário o verbo. Se a banca fosse minha, sinceramente, eu apagaria o verbo.
O anúncio encurtou ainda mais: PEIXE FRESCO.
- Me diga uma coisa: por que apregoar que o peixe é fresco? O que traz um freguês a uma feira, no cais do porto, é a certeza de que todo peixe, aqui, é fresco. Não há no mundo uma feira livre que venda peixe congelado…
E lá se foi também o adjetivo. Ficou o anúncio reduzido a uma singela palavra: PEIXE.
Mas, por pouco tempo. O compadre pondera que não deixa de ser menosprezo à inteligência da clientela anunciar, em letras garrafais, que o produto aí exposto é peixe. Afinal está na cara. Até mesmo um cego percebe, pelo cheiro, que o assunto, aqui, é pescado…
O substantivo foi apagado. O anúncio sumiu. O quadro-negro também. O feirante vendeu tudo. Não sobrou nem a sardinha do gato. E ainda aprendeu uma preciosa lição: escrever é cortar palavras.