Ontem à noite quando eu vinha do trabalho sentei em uma cadeira do lado de uma janela dentro do ônibus. Estava meio pensativo. Encostei a cabeça no vidro e fiquei olhando aqueles prédios altos enquanto o ônibus fazia o seu percurso normal. Dentro de mim um sonho invadia os meus pensamentos: queria ser um dos moradores de um daqueles prédios. Fiquei me imaginando morando no alto. Bem alto. Um apartamento espaçoso, arrumado, do lado da sombra e bem arejado. Pensei tanto, tanto que cheguei a fechar os olhos e sonhar acordado. Quando voltei à realidade vi que os meus pensamentos eram apenas desejos frustrados. Com o salário que ganho jamais terei a chance de morar em um lugar tão emocionante e tão chique quanto um apartamento de luxo.
Desencostei a minha cabeça do vidro da janela, ajeitei o meu corpo na cadeira e percebi que eu teria de descer na parada seguinte. Dentro do ônibus tinham muitos estudantes que estavam vindos da faculdade. Dei uma olhada rápida em todos e fiquei pensando comigo: um dia também fui um estudante igual a eles, mas não prossegui. Abandonei os livros depois de ter terminado o ensino médio e hoje estou aqui vindo do trabalho com um pacote de pão nas mãos.
Senti-me angustiado e fiquei pensando que todos já nascemos com o destino traçado. Quem veio ao mundo para conseguir e possuir alguma coisa, a tem e a possui. Quem veio para não possuir nada, por mais que tente, não conseguirá.
Lembrei do meu pai que desde jovem foi pescador e nunca conseguiu construir sua casinha de tijolo. Enquanto que pescadores mais novos, com o mesmo trabalho que o meu pai tinha, construíram casas, compraram carros... Progrediram.
Eu não tenho dúvidas que o destino existe. Lógico que, muitas vezes, a gente procura mudar algumas situações. Só, nem sempre, se consegue alcançar os objetivos. Conheço tanta gente que já ralou tanto na vida em prol dos seus planos e continuam piores do já foram. São pessoas que nas nasceram com estrelas na testa. Ou será que estou errado em pensar assim? Não sei.
Voltando a mim.
Eu puxei o cordãozinho da campanhinha do ônibus e desci. Peguei o meu celular e liguei pro taxista que me deixa em casa todas as noites. Rapidinho ele me pegou na parada e me trouxe. No caminho puxei conversa. Perguntei o que ele acha da minha pessoa. E ele me disse que se eu não fosse gente boa ele teria percebido desde o primeiro dia em que veio me deixar aqui. E isso já tem um ano. Então ele continuou falando que é fácil perceber as pessoas que têm corações bons. E que eu sou uma dessas pessoas que merece ser feliz.
Eu o interrompi dizendo-lhe que dentro de mim existe uma voz que me diz que um dia encontrarei o meu caminho. Não sei quando. Mas chegará o meu dia.
Ele é um senhor de idade que não parece ter a idade que tem: 62 anos. Uma pessoa que desde muito tempo trabalha na noite e que já foi assaltado três vezes. Mesmo assim nunca perdeu sua fé em Deus e continua seguindo seu caminho. Não somos amigos ainda, mas conversamos bastante sempre.
Ele parou de frente a minha casa como sempre faz, esperou que eu abrisse os cadeados do portão: são três. E me desejou uma boa noite. Entrei e estou aqui escrevendo como sempre faço quando chego do trabalho na madrugada.
A minha TV tá ligada aqui na minha frente sem som e estou apenas ouvindo Enya cantar suas músicas quase instrumentais. São elas que sempre ouço quando me sento para escrever. A melodia enche a minha alma de inspiração e me traz certa felicidade enquanto os meus dedos deslizam nesse teclado digitando palavras que formam as frases dos meus textos tão simples por eu não tantos conhecimentos como deveria. É por isso que esse blog é diferente de tantos que conheço. Aqui escrevo sobre mim sem medo dizer quando estou triste, quando me decepciono ou quando choro. Nunca tive vergonha dos meus sentimentos. Acho que é por isso que ainda não encontrei a pessoa que nasceu pra mim.
Às vezes tem gente que acha meloso demais ouvir alguém falar de amor com tanta sinceridade. Tenho colegas que não curtem sinceridade sentimental. Metade diz que o amor não existe e a outra metade fica em cima do muro. A metade que crer na não-existência do amor diz que é feliz porque não se apega a ninguém. E a metade que fica em cima do muro, muitas vezes ama e não sabe se deve demonstrar seu sentimento.
Eu não tenho medo de dizer que amo, se eu estiver amando. Não tenho vergonha de dizer que gosto se estiver gostando. Sou assim. Nasci assim. Vivo assim.
João do Amor