terça-feira, 13 de julho de 2010

O Dizer e o Fazer

Dois amigos estavam sentados fora da porta de casa conversando. Ouviram dizer que certa lagoa, pouco distante, estava cheias de grandes peixes. O primeiro começou a agitar-se. Procurou saber se a notícia era verdadeira, e foi conversar com os pescadores, um por um, a fim de conhecer qual a melhor isca para pegar aqueles peixes. O segundo foi imediatamente buscar o seu instrumento de pesca; ao longo do caminho foi catando algumas minhocas e, ao chegar à beira do lago, jogou o anzol. Quando o primeiro chegou, o segundo já tinha pescado um balde cheios de peixes grandes. Para o primeiro, sobraram só alguns peixinhos.
Estou quase envergonhado de ter contado essa pequena história, quando no evangelho deste domingo o próprio Jesus nos oferece a maravilhosa parábola do bom samaritano. Eu quis apenas apresentar um exemplo de como nós agimos, muitas vezes, ou melhor, como deixamos de agir.
Somos todos mestres nas conversas. Com as palavras apresentamos tudo novo, extraordinário e em perfeito funcionamento. Isto vale para um time de futebol, para um governo, para uma paróquia. Parece que muitos sabem sempre o que é certo e deve ser feito; e se as coisas não funcionam, é porque eles não foram chamados a dirigir. Claro que tudo isso também faz parte da nossa convivência na sociedade. Não nos cabe só o direito de expressar as nossas opiniões, mas temos, também, o dever de colaborar com o funcionamento da sociedade. Quando as pessoas conversam, criticam, dão palpites, é um bom sinal: ainda tentam pensar e sonhar algo de melhor. Muito pior seria a indiferença, a não participação, o não votar, por exemplo.

Contudo sempre devemos lembrar a enorme distância que separa o dizer e o fazer. Muito mais fácil falar, muito mais difícil – às vezes impossível – realizar o que pensamos e gostaríamos realizar. A parábola do bom samaritano diz a respeito ao amor, à justiça e à solidariedade. Talvez sejam as palavras sobre as quais mais conversamos, reclamamos, discutimos. Enfim, gastamos muitas conversas, muitos discursos. Poucas vezes praticamos o que reivindicamos, ou o que apontamos como falho na sociedade e, em geral, nos outros.
O evangelho não nos diz, expressamente, as razões pelas quais o sacerdote e o levita da parábola não pararam para ajudar o homem ferido na beira da estrada. Podemos imaginar, somente. Com certeza deviam ter boas razões, ao menos segundo a consciência deles. Não cabe a nós julgar. O que podemos fazer é imitar o bom samaritano. Este sempre será o exemplo de quem ajuda, sem questionamentos ou pré-conceitos. As coisas que o bom samaritano possa ter pensado - que não era tarefa dele, que não tinha mais segurança nas estradas, que podia envolver-se numa bronca - não foram suficientes para fazê-lo desistir de ajudar. Ao contrário, fez tudo o que podia e ainda pagou pelo serviço da hospedaria. Foi muito generoso, deu a sua atenção, o seu carinho, o seu tempo e do seu dinheiro! Não ficou indiferente, não ficou olhando de longe aquela triste situação, mas solidarizou-se com o sofredor, tornou-se próximo, amigo e irmão dele. Se ainda o mestre da lei do evangelho duvidava sobre quem era o seu próximo, Jesus lhe deu a melhor e a mais concreta explicação. O nosso próximo é aquele que precisa de nós e a quem nós mesmos, livremente, e por amor, decidimos ajudar.
Essa é a caridade imediata ou “assistencial”, se preferirmos. Ela pode ter muitos defeitos: a acomodação de quem recebe, a exploração da generosidade alheia, talvez o entorpecimento da consciência de quem ajudou e não quer comprometer-se mais para encarar as dimensões maiores do problema. Precisamos, evidentemente, que a caridade verdadeira olhe, também, as raízes das injustiças, as causas endêmicas dos sofrimentos. O amor e a justiça verdadeira exigem sempre mais compromisso. No entanto a caridade deve começar com algo concreto, um gesto, uma ação que nos desinstale da indiferença, das palavras bonitas, nos faça sujar as mãos e palpitar o coração. O amor ao próximo se aprende amando e servindo os pobres, os pequenos, os sofredores. Uma atitude sempre humilde e grande ao mesmo tempo.
Quantas vezes ouvimos de alguém que foi ajudado dizer: - Estava naquela situação até que apareceu um filho de Deus... Quem ajuda é chamado “filho de Deus”. Isso, só para lembrar que o machucado na beira do caminho é a própria humanidade e quem se fez, uma vez por todas, nosso próximo, o bom samaritano para sempre, e que pagou muito caro por sua ajuda, foi o próprio Jesus.  Afinal ele é o herói da parábola. É o exemplo.

Dom Pedro José Conti


Um comentário:

tallys disse...

concordo totalmente!mas ação que palavras