quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Crítica de Ariano Suassuna sobre o forró atual (mudando um pouco de assunto...)

'Tem rapariga aí? Se tem, levante a mão!'. A maioria, as moças, levanta a mão. Diante de uma plateia de milhares de pessoas, quase todas muito jovens, pelo menos um terço de adolescentes, o vocalista da banda que se diz de forró utiliza uma de suas palavras prediletas (dele só não, e todas bandas do gênero). As outras são 'gaia', 'cabaré', e bebida em geral, com ênfase na cachaça. Esta cena aconteceu no ano passado, numa das cidades de destaque do agreste (mas se repete em qualquer uma onde estas bandas se apresentam). Nos anos 70, e provavelmente ainda nos anos 80, o vocalista teria dificuldades em deixar a cidade.

Pra uma matéria que escrevi no São João passado baixei algumas músicas bem representativas destas bandas. Não vou nem citar letras, porque este jornal é visto por leitores virtuais de família. Mas me arrisco a dizer alguns títulos, vamos lá: Calcinha no chão (Caviar com Rapadura), Zé Priquito (Duquinha), Fiel à putaria (Felipão Forró Moral), Chefe do puteiro (Aviões do forró), Mulher roleira (Saia Rodada), Mulher roleira a resposta (Forró Real), Chico Rola (Bonde do Forró), Banho de língua (Solteirões do Forró), Vou dá-lhe de cano de ferro (Forró Chacal), Dinheiro na mão, calcinha no chão (Saia Rodada), Sou viciado em putaria (Ferro na Boneca), Abre as pernas e dê uma sentadinha (Gaviões do forró), Tapa na cara, puxão no cabelo (Swing do forró). Esta é uma pequeníssima lista do repertório das bandas.

Porém o culpado desta 'desculhambação' não é culpa exatamente das bandas, ou dos empresários que as financiam, já que na grande parte delas, cantores, músicos e bailarinos são meros empregados do cara que investe no grupo. O buraco é mais embaixo. E aí faço um paralelo com o turbo folk, um subgênero musical que surgiu na antiga Iugoslávia, quando o país estava esfacelando- se. Dilacerado por guerras étnicas, em pleno governo do tresloucado Slobodan Milosevic surgiu o turbo folk, mistura de pop, com música regional sérvia e oriental. As estrelas da turbo folk vestiam-se como se vestem as vocalistas das bandas de 'forró', parafraseando Luiz Gonzaga, as blusas terminavam muito cedo, as saias e shortes começavam muito tarde. 

Numa entrevista ao jornal inglês The Guardian, o diretor do Centro de Estudos alternativos de Belgrado. Milan Nikolic, afirmou, em 2003, que o regime Milosevic incentivou uma música que destruiu o bom-gosto e relevou o primitivismo est tico. Pior, o glamour, a facilidade estética, pegou em cheio uma juventude que perdeu a crença nos políticos, nos valores morais de uma sociedade dominada pela máfia, que, por sua vez, dominava o governo.

Aqui o que se autodenomina 'forró estilizado' continua de vento em popa. Tomou o lugar do forró autêntico nos principais arraiais juninos do Nordeste. Sem falso moralismo, nem elitismo, um fenômeno lamentável, e merecedor de maior atenção. Quando um vocalista de uma banda de música popular, em plena praça pública, de uma grande cidade, com presença de autoridades competentes (e suas respectivas patroas) pergunta se tem 'rapariga na plateia', alguma coisa está fora de ordem. Quando canta uma canção (canção?!!!) que tem como tema uma transa de uma moça com dois rapazes (ao mesmo tempo), e o refrão é 'É vou dá-lhe de cano de ferro/e toma cano de ferro!', alguma coisa está muito doente. Sem esquecer que uma juventude cuja cabeça é feita por tal tipo de música é a que vai tomar as rédeas do poder daqui a alguns poucos anos.

Ariano Suassuna

5 comentários:

Sandra Rodrigues disse...

Pura verdade...após ler esta postagem,fui arrumar minha residencia,. e liguei o radio pra mim distrair, acho que contei em dez minutos amesma musica que tocou na mesma radio, umas 5 vezes, mas ou menos. uma musica ridicula, acabando a mulher literalmente. e o pior que elas respondem né?!!!

infelismente.


Um abraço

Luiz Teixeira disse...

Faço coro com Sandra !! Quanto lixo se ouve nas rádios e o nosso forró então! Mas a pergunta que sempre faço: As rádios tocam lixo pois o povo gosta ou o povo gosta de lixo por que as rádios tocam?

Consolo: Ainda há algumas rádios que podemos nos refugiar, basta procurar um pouquinho...

Um abraço a todos !

Camila Nicácio disse...

Tive um prof de inglês q ficou estupefato qnd me ouviu falar q eu ainda ouvia rádio, diante dos novos aparelhos (mp3, iPhone etc)..os quais permitem q vc ESCOLHA seu repertório, evitando mal estar quando aquela música horrível começa a tocar. Mesmo assim, as rádios fazem sucesso e coloca garganta a baixo os mais diversos estilos. Acredito que o que mais pesa nessa história toda é a pouca atenção que se dá a letra de tais músicas, e há aqueles que realmente apreciem as letras. Enfim, algo me deixou feliz com essa matéria, não sei cantar nenhuma dessas músicas =D

Abs,

Mila N.

Nednaldo disse...

Olá!As ler esta reportagem me lembrei das músicas que passavam nas rádio quando eu era criança. Os tempos mudaram e as pessoas parecem se tornar menos exigentes com o que ouvem. Precisamos urgênte de ler mais e escutar MÙSICAS de qualidade. Vamos resgatar nossa CULTURA. Acredito somente que devemos cada vez mais influenciar a reflexão sobre o que foi bem dito no artigo.

Antonio Carlos disse...

Sexualização da sociedade... prazer por prazer... Isso atrai, é verdade, principalmente em uma sociedade epidérmica como a atual. Mas muitas outras coisas atraem também... A pergunta q devemos fazer: ISSO É POSITIVO?

Acho q não, principalmente nas camadas mais desprivilegiadas, onde o sexo entra no rol das fugas dos problemas cotidianos, como a droga; o que na verdade só vai aumentar os problemas deles q já são muitos e complexos.