Uma crônica de Dom Helder Câmara, publicada em “Um olhar sobre a cidade” que reúne suas meditações matinais lidas pela Rádio, quando Arcebispo de Recife, trata do apelo e saudação no início da oração sacrifical: “Corações ao alto!” e comenta: “palavra fácil de ouvir. Mas, já experimentaram ajudar corações a elevar-se?”
E, na continuidade, fala de corações cheios de revolta, avaros, gelados e conclui: “Corações ao alto! Que esta expressão seja em nossos lábios uma prece...” para que o nosso e todos os corações se elevem ao nosso Pai Celeste.
Na correria do dia-a-dia, perdemos, por falta de tempo, ou por desperdício de tempo, a oportunidade de nos deliciar com as maravilhas de Deus. “Corações ao alto!” é um convite da liturgia para nos desligarmos do tempo, embora ainda no tempo, e nos concentrarmos no mistério da morte redentora de Cristo, pela qual rendemos a Deus louvor e ação de graças.
São muitas as aclamações e apelos na liturgia. Povo sacerdotal, nossa participação na missa não se reduz a uma assistência passiva.
Na continuidade da oração eucarística, elevando nosso coração para as alturas, somos convidados a cantar a glória de Deus que enche o universo. O profeta Isaías foi conduzido a contemplar o esplendor divino. E descreve: sua presença enchia o santuário, enquanto se ouviam as vozes dos Serafins que clamavam: ”Santo, santo, santo é Javé dos exércitos. Sua glória enche toda a terra” (cf. Is. 6, 1-3).
A oração eucarística tem três pontos essenciais, a que a liturgia nos chama à participação. A súplica para Deus que aceite nossas ofertas - “Recebei, Senhor, nossas ofertas” -, a invocação ao Santo Espírito para que desça sobre elas a fim de que se tornem o Corpo e Sangue de Cristo e nos una num só corpo –“Manda vosso Espírito Santo” - e a lembrança viva da morte e ressurreição do Senhor que é atual no altar e, também, a lembrança de toda a comunidade dos fiéis, dos que já estão junto de Deus, a Igreja triunfante e a padecente e a Igreja peregrina neste mundo. Após a consagração, nós afirmamos nossa fé no mistério redentor. Não é um momento para outros cânticos, mesmo de adoração. É uma confissão solene de fé, seguida dos pedidos pela Igreja – Lembrai-vos de vossa Igreja, lembrai-vos de vossos filhos. E, na conclusão desta oração, após a doxologia pronunciada pelo sacerdote, respondemos Amém, sintetizando, como ensina Santo Agostinho, toda nossa adesão e participação no sacrifício.
Redimidos pela cruz, podemos invocar a Deus, como Jesus nos ensinou, chamando-o de Pai. Ele nos dá a paz pelo seu Filho, se aceitarmos o convite de amar nossos irmãos e de pedir-lhes perdão.
Ensina Santo Tomas que “quem oferece o sacrifício dele deve participar (cf. Suma, 3, q.82 4c). O presidente da celebração nos chama a receber as nossas ofertas agora transubstanciadas no Corpo e Sangue do Senhor.
Também na liturgia da Palavra, devemos ser ouvintes atentos e aclamá-la com nossa ação de graças e louvor ao Cristo no cântico do Alleluia e no final do Santo Evangelho.
A todo o momento somos chamados à participação, para a confissão de nossos pecados, para rezarmos pelas necessidades de cada dia e de cada tempo e naquela saudação muitas vezes repetida: “O Senhor esteja convosco”, a que respondemos com a certeza de que Ele está entre nós, pois “Onde dois ou mais estiverem reunidos em meu nome, Eu estarei no meio deles” nos afirmou Jesus no Evangelho.
Muitas vezes, a título de ser mais comunicativos, alteramos a fórmula consagrada na liturgia. Certo se conservar o respeito e o sentido, não se rebaixando ao vulgar e ao popularesco.
São Paulo e os Sinóticos nos lembram que Jesus ao instituir a Eucaristia, mandou que o fizéssemos em sua memória. Toda a liturgia da missa se reporta àquela hora e ao momento em que, na cruz, realizou a nossa redenção. Não é, pois, um show ou mesmo a representação de um drama.
Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora/MG
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